a aniquilação do ego
o pepê rapazote disse, há uns anos, em entrevista ao expresso, que “o ego para ser bem considerado, tem que ter por base uma auto-confiança saudável e uma generosidade natural, construído para bem do próximo”. acrescentou ainda que “um ego mal construído vai destruir-nos a nós e maltratar os outros”.
não consigo precisar quando foi que nasceu este “critica por favor o meu elevado ego”. o seu nome é retirado de uma música do xeg, se não estou em erro de 2001, e pareceu-me, na altura, um nome apropriado para este espaço que já conheceu outros nomes antes deste. apropriado porque antitético na sua essência.
um elevado ego é percepcionado, na maioria das vezes, como alguém arrogante, cheio de si, altivo, cheio de certezas e desprezo por aqueles que considera inferiores a si.
muita gente houve que, ao longo dos tempos, preferiu fazer um julgamento rápido e atribuir-me todos estes, que considero serem, defeitos à minha personalidade, sem tentarem perceber se assim era. aceitei que o fizessem, sem grande protesto, porque gente que chega a este tipo de conclusões sem se dar ao trabalho de tentar perceber se assim é é o tipo de gente de que não preciso, nunca precisei ou alguma vez quis.
é que muitos dos meus detractores olharam sempre para a parte do “elevado ego” do título deste espaço, que é pessoal, e não viram, ou preferiram não ver, o pedido de crítica logo no seu início. como é que se explica que um “elevado ego”, alguém “arrogante, cheio de si, altivo, cheio de certezas e desprezo por aqueles que considera inferiores”, esteja tão interessado em saber a opinião dos outros sobre si mesmo, ao ponto de lhes pedir “por favor” que façam essa “crítica”?
nunca percebi esse raciocínio, mas também nunca perdi muito tempo com quem assim pensava.
“you know what they say about assuming… when you assume, you’re just a bitch” é uma citação de two and a half men de que gosto muito e que sempre apliquei a esses pobres de espírito que nunca quiseram sair da sua zona de conforto e explorar além dos próprios preconceitos sobre quem não conhecem, nem alguma vez se esforçaram por conhecer.
alguém que conheci recentemente, e por quem ganhei grande estima, fez-me ver, não há muito tempo, que a minha atitude de “sou como sou e não quero saber se, digam o que disseram, gostam de mim ou não” foi um dos motivos que o levou a não gostar de mim quando me conheceu. felizmente, tive a sorte e a felicidade de me ter dado uma segunda oportunidade depois daquela horrível primeira impressão com que ficou e, desde então, fiz de tudo para merecê-la.
mas o importante aqui é que fez-me reflectir naquela atitude “eu contra o mundo” – bastante menos “rebelde” ou “revolucionária” que noutros tempos, é certo – e perceber que nunca iria trazer nada de bom para a minha vida. tentei argumentar que não era bem assim, porque, se eu percebesse que quem estivesse a fazer essa crítica que eu tão ostensivamente peço no título deste blog valesse a pena, deixaria a pessoa entrar e acolhê-la-ia de braços e coração abertos, mas depressa percebi que tinha inteira razão.
essa reflexão continua.
isto para dizer que sempre achei aquela citação do pepê rapazote tão certeira que nunca mais me esqueci dela e tentei sempre segui-la, sem desviar-me. passei os últimos anos, mais do que aqueles que consigo contar, a aprender com os erros, a identificar defeitos que não percebia serem defeitos, a aceitar críticas de quem as quis dar e a construir uma versão melhorada de mim mesmo, tentando sempre ser o melhor de mim.
passei os últimos anos a resolver constantemente a minha vida. amores que ficaram mal resolvidos, paixões desregradas que terminaram com o meu coração em cacos, relações mal terminadas, tudo o que pudesse espoletar alguma espécie de conflito interno que não me permitisse saber estar com os outros, fosse numa relação romântica ou de amizade. analisei e dissequei os acontecimentos, as discussões e as zangas, de forma a conseguir perceber onde foi que errei e o que poderia fazer para ser melhor. melhor pessoa. melhor amigo. melhor namorado.
escolhi dar um passo atrás para, mais tarde, poder dar dois passos em frente.
fi-lo sempre com uma série de princípios e valores que acho imprescindíveis e fundamentais na prossecução desse objectivo: o respeito pelo próximo, pela dignidade humana, a generosidade, ser gentil e cuidar do próximo, servir a(s) comunidade(s) em que estou inserido, entre tantos outros.
acredito fundamentalmente que devemos esforçar-nos para sermos a melhor versão de nós próprios.
passei os últimos anos a acreditar nessa construção que fiz de mim mesmo, fundada nesses princípios e valores tão importantes e sagrados para mim. é certo que me fui desviando, uma e outra vez, desse caminho, mas contei sempre com a ajuda preciosa de tanta gente boa com que me fui rodeando para voltar ao trilho certo. nem sempre me disseram as coisas da melhor maneira, ou com a melhor das intenções, mas tive a humildade de reconhecer quando tinham razão e pedir desculpa quando devia fazê-lo.
até que descobri que fiz algo que faz de mim não mais do que uma fraude. um falhanço. um falhado. que, com consciência muito alterada, caí num velho vício que acreditava há muito ter abandonado. que não mereço as pessoas que tenho em meu redor.
de que vale dizeres à boca cheia que és a melhor versão de ti próprio se, quando perdes a consciência e o controlo e quando mais precisas de ser forte, mais não és do que um merdas que não merece o ar que respira? não, não é desculpa. nunca foi, não seria agora que passaria a ser.
“a queda foi de ordem tal que nem sabes o que fazer e muito menos como te poderás erguer. é que não há melhor para recomeçar do que o lugar onde já nada há para piorar”. esta é uma citação em que tropecei no instagram nos últimos dias e que descreve na perfeição a espuma dos meus dias.
bati no fundo. estou completamente consumido pela vergonha de ter feito o que fiz e ter permitido que isto acontecesse, porque viola tudo aquilo em que acredito, a confiança de quem me rodeia, os tais princípios e valores que defendo, de quem sou. perdi a alma e não sei mais quem sou.
agora não foi apenas um passo atrás. foi um trambolhão escadas abaixo. este ego foi estilhaçado, colapsou, vítima de auto-sabotagem, e eu não sei se tenho a energia para reerguer-me e voltar a fazer este caminho, com o corpo cansado e doente, ou se me deixo ficar aqui, agrilhoado a este ódio e desprezo por mim mesmo que deixo que cresçam dentro de mim.
:: treze de setembro de dois mil e vinte
November 8th, 2021 at 00:57
[…] amor não é. infelizmente, fui muitas vezes essa pessoa. também por isso sempre quis ser melhor. não sou perfeito, tão pouco aspiro a sê-lo. não atravesso a vida erguido em nenhum pedestal, até porque, embora não tenha vertigens, sei […]